07 Aug 2019 | Entrevistas
A condição humana
Jean-Paul Sartre – pai do Existencialismo
Teresa – Considerando a condição humana, observam-se comportamentos pacíficos e comportamentos violentos. É possível afirmar que há homens predispostos ao bem e outros, ao mal?
João Roberto – Vamos refletir sobre a condição humana. Do ponto de vista da ciência, o homem é, simultaneamente, filho da cultura e da biologia. É óbvio que o comportamento humano está marcado pela história biológica, pela evolução da vida no planeta por milhares e milhares de gerações, que foram construindo respostas adaptativas às circunstâncias. Por outro lado, existe a dimensão cultural. Costumo lembrar que somos, em larga escala, filhos da cultura. Pretendo dar maior ênfase às questões humanas. Do ponto de vista da biologia há o que fazer, mas é muito pouco.
Como atuar biologicamente para o indivíduo ser mais feliz, para que mude o comportamento, o jeito de sentir e de agir no mundo? A ciência ainda não tem, embora com seu vertiginoso desenvolvimento, o poder de interferir com segurança no cérebro humano para promover, consistentemente, a felicidade tão desejada. A estrutura de compreensão do ser humano é herdeira de seu repertório existencial. O estado psicológico da mãe que gera o filho representa uma influência cultural. A criança, quando nasce, já recebe a influência materna. Há, por exemplo, pesquisas mostrando que o gosto por amamentar o filho está relacionado com a alimentação da mãe, no período de gravidez.
O domínio da cultura sobre o indivíduo, naturalmente, é muito maior depois que ele vem ao mundo. Gosto de usar a metáfora do caldeirão de feijoada, com seu denso caldo. Tudo o que colocamos na caldeira pega o sabor da feijoada. Quando nascemos, caímos em um caldo de cultura em ebulição e assimilamos o gosto da mãe, do pai, da família, dos vizinhos, dos amigos da escola, dos filmes que vemos, do que está na mídia. Vamos pela vida afora assimilando o estilo daquilo que está em nosso entorno. Do livro maravilhoso que lemos. Do Faustão, do Gugu, do Sílvio Santos.
Chega o momento em que surge a interrogação: – Quem sou eu? Qual é minha natureza? Isto sou eu ou foi construído com tão fortes e inexoráveis influências? Aliás, temos dois grandes desafios: o de nascer pela primeira vez, de sair do conforto do útero materno e ser lançados nesse caldo. Mas há o desafio maior – o de nascer pela segunda vez. A maioria dos seres humanos morre sem ter nascido para eles próprios, porque reproduzem padrões da família, da sociedade, dos estereótipos. Que hora posso afirmar que sou eu, que deixei de reproduzir os modelos do que li e vi? Quando eu filtro as influências todas? Quando tenho liberdade e autonomia? A autonomia e a liberdade do indivíduo nascem na mente, quando ele deixa de se sujeitar aos modelos impostos e se torna, pela reflexão, ele próprio, sujeito de conhecimento. Nesse sentido, a minha visão é existencialista. Segundo a filosofia existencialista, se fosse possível resumir em uma frase, eu diria que a existência precede a essência, ou seja; a primeira constrói a segunda. Não podemos falar em essência do ser humano, pois ela é produto da construção de uma história, de um grupo, ou da humanidade em um dado momento. Logo, não há natureza definida a priori. O ser humano não é violento nem pacífico. É na evolução que ele se define. Gosto muito de escapar dos rótulos, porque eles imprimem o lugar-comum.
João Roberto de Araújo é pensador, escritor de conteúdos para educação socioemocional e fundador da 50-50 SEL Solutions.