07 Aug 2019 | Artigos
O sofrimento psicológico de hoje
Ao olhar para o passado, cientistas, historiadores e filósofos constatam que a condição humana incluiu dor substancial. O sofrimento significativo no passado era o resultado dos aspectos básicos para a sobrevivência, especialmente a fome, as pragas e as guerras.
Nos tempos antigos, na Idade Média, e mesmo até bem recentemente, a fome foi um grande flagelo para a humanidade. Quaisquer condições climáticas adversas, como secas ou inundações prolongadas, devastaram colheitas inteiras, e milhões de pessoas morreram por falta de comida. Com os avanços científicos envolvendo agricultura, preparo do solo, fertilizantes e pesticidas associados à previsão do clima, hoje, em números gerais, estamos morrendo mais por comer demais do que por falta de comida. Em 2010, uma pesquisa da Organização Mundial da Saúde (OMS) demonstrou que a fome e a desnutrição, combinadas, mataram cerca de 1 milhão de pessoas, enquanto a obesidade matou 3 milhões. Sabemos que ainda existem focos de fome em alguns países, no entanto, isso decorre mais de razões políticas, da incompetência logística para entregar alimentos às populações mais carentes, da distribuição inadequada de renda.
Por sua vez, a peste negra no século XIV matou um terço da população da Eurásia. A varíola, no século XVI, e a gripe espanhola, em 1918, criaram um cenário dramático de desespero de mães e famílias que viram seus filhos e parentes morrerem sem qualquer possibilidade de ajuda. As descobertas científicas ligadas à área da saúde e a compreensão, evidenciada pela ciência, dos seres microscópicos e das doenças por eles causadas possibilitaram as vacinas e acabaram com esse sofrimento. O desenvolvimento científico aliviou o sofrimento físico de milhões de pessoas.
Hoje em dia, os flagelos são diferentes e clamam por novas respostas na ciência e na educação.
Estamos passando por uma crise de bem-estar. De acordo com uma pesquisa da OMS (2015), existem 322 milhões de deprimidos no mundo e o mesmo número sofre de ansiedade. Essa realidade do adoecimento psicológico é responsável por incapacidades generalizadas que prejudicam a vida pessoal, social e profissional. Todos os anos mais de 800.000 pessoas se suicidam, e essa é considerada a segunda maior causa de morte de jovens entre os 15 e os 29 anos. Em todo o mundo, meio milhão de pessoas morrem a cada ano como vítimas de violência. Dentro das famílias, a portas fechadas, muitas crianças, mulheres e idosos sofrem maus-tratos. O uso abusivo do poder subjuga as mulheres e explora sexualmente meninos e meninas, que são mutilados psicologicamente. Nas ruas, seja coberta pelas sombras da noite, seja ao meio-dia, a delinquência juvenil está se espalhando. Dos ocasionais blues às ações nefastas do crime organizado e do tráfico de drogas, vivemos em uma sociedade com muitas mortes violentas, com muito medo e sofrimento.
O progresso material e tecnológico tem trazido encantamento e benefícios tangíveis à sociedade, ao reduzir as dificuldades humanas, mas não garante o bem-estar subjetivo, a tão sonhada e desejada felicidade das pessoas. Estamos nos conscientizando de que, junto com o progresso, o sofrimento psicológico vem em seu rastro. Os conflitos entre casais e entre pais e filhos e a dor psicológica revelada no mal-estar subjetivo generalizado constituem o maior desafio na agenda da humanidade para este século.